MULHERES ORGANIZAM 'CALCINHAÇO' EM ÚNICA ASSEMBLEIA DO PAÍS SEM DEPUTADA
Em 40 anos (o estado é jovem, foi instalado em 1979), apenas 11 mulheres tomaram posse como deputada estadual -a maioria por ter ligações familiares e conjugais com líderes políticos.
Única do país sem deputadas, a Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul será o destino nesta terça-feira (3) de um grupo de mulheres que participarão do "Calcinhaço da Democracia", um protesto para pedir mais atenção à pauta feminina na Casa.
A manifestação, convocada via redes sociais por coletivos feministas e integrantes de partidos como PSOL e PT, é motivada por dois fatores, segundo as organizadoras: a falta de representatividade no Legislativo local e falas de deputados contra o Carnaval consideradas moralistas.
Como a Folha de S.Paulo mostrou em dezembro, a Assembleia sul-mato-grossense tem as 24 cadeiras ocupadas por homens, algo que não ocorria desde 1987. A situação reflete o histórico de predominância masculina no poder estadual.
Em 40 anos (o estado é jovem, foi instalado em 1979), apenas 11 mulheres tomaram posse como deputada estadual -a maioria por ter ligações familiares e conjugais com líderes políticos.
"Quem tem medo de calcinha na Assembleia Legislativa terá que correr!", postou nas redes sociais uma das agitadoras da manifestação, que ganhou corpo depois da primeira sessão pós-Carnaval, realizada na quinta-feira (27).
Na ocasião, parlamentares se queixaram de problemas na festa na capital do estado, Campo Grande, como casos de vandalismo e violência. Foi o discurso do deputado Professor Rinaldo (PSDB), reclamando de transtornos aos fiéis de uma igreja evangélica, que acabou dando o mote ao protesto.
"Tem que respeitar também os direitos daqueles que professam a sua fé. E as cenas que foram apresentadas ali foram terríveis, degradantes. Pessoas urinando em frente ao culto. Teve mulheres que tiraram a calcinha", afirmou ele ao microfone.
Segundo o tucano, foi descumprido um acordo para que blocos se abstivessem de passar na rua do templo. Os defensores da folia dizem que o combinado foi seguido, mas que foliões usaram a via, que é pública, para chegar às concentrações.
"Relatei o que ouvi dos pastores", diz Rinaldo à reportagem. "Não gosto de Carnaval, mas respeito quem vai e acho que é um direito, desde que não cerceie o direito do outro." O tucano é fiel da igreja que mencionou no plenário, mas não presenciou a cena narrada.
A menção à roupa íntima feminina incendiou o debate nos grupos feministas. Para parte das manifestantes, o deputado sugeriu que uma peça foi deixada na igreja e deveria ter provas disso antes de propagar a informação. O deputado diz não saber detalhar a situação, já que não a viu.
"Usaram uma sessão inteira para criticar o Carnaval sob alegação de ter encontrado uma suposta calcinha, que ninguém viu, em frente uma igreja", afirma a advogada Janice Andrade, uma das puxadoras do "Calcinhaço".
Segundo ela, os comentários de deputados do PSDB, Solidariedade e PSL contra a folia acabaram por criminalizar a festa e seus frequentadores, muitos deles moradores da periferia.
"Defendo o direito de todos ao acesso ao lazer gratuito", diz a advogada e ativista, integrante da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia. "A indignação de todas as organizadoras é com o descaso dos deputados com as pautas importantes."
Durante o protesto, as participantes estenderão um varal com calcinhas na frente do prédio do Legislativo. Elas pretendem ainda recolher peças novas, que serão depois doadas a mulheres em situação de rua.
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