
Desde que tenho memória, Ilhéus tem sido uma cidade favorecida pela chuva. A quantidade de precipitação em Ilhéus é superior à de Londres! Apenas não é maior do que a de Macondo, onde a chuva caiu incessantemente por quatro anos, onze meses e dois dias.
Ilhéus é uma cidade abençoada pelas águas. Não importa o quanto chova aqui, já enfrentamos períodos de seca. As pessoas tendem a esquecer rapidamente e não recordam do racionamento que foi necessário quando a represa do Iguape atingiu um nível alarmante. Eu relato isso em A invenção de Santa Cruz:
“A presença da ausência das marés de março, em noites de lua cheia e lua nova, causaram estranhamento. O mar permaneceu como os anos anteriores: sereno. (...) A mudança dos ventos, o recuo das marés, a falta de chuvas, a seca tinha o dedo dos homens. A natureza não aguentava mais aquelas ações irresponsáveis e prontamente estava respondendo. E o povo de Santa Cruz nunca imaginou que um dia sentiria falta das ondas que destruíam a orla da Zona Norte, derrubando muros e casas e encurtando as praias da Zona Sul. As chuvas, que vinham sem avisar, derretendo as ruas do centro e da periferia, invadindo as lojas, causando prejuízos, arrastando tudo que encontrava pelo caminho. Como todos os carregamentos de cacau, arrastados pela correnteza das águas, em 23 de junho de 1914, após invadirem os armazéns da Rua do Dendê, Rua da Inconfidência e do Arraial do Banco. De forma irônica, as tempestades grapiúnas foram mais desejadas naqueles dias que a seca reinante”.
Antes que isso possa se repetir, por que não criamos um plano de contingência? Por que não criamos um projeto de captação da água da chuva e que toda residência, comércio ou indústria daqui para frente fosse obrigado a captar água da chuva? Por que não criamos um grande projeto de conscientização ambiental? E aí, Maramata, Secretaria de Meio Ambiente, o que vocês estão esperando?
A água não é um produto inesgotável. Todo mundo sabe disso. Ela vai acabar. Será uma moeda de troca no futuro. No futuro, não. Hoje, em alguns países da África, da Ásia e do Oriente Médio a água é um bem valiosíssimo. E no nosso sertão? Quem tem água, tem tudo!
O Kuwait, país com menor disponibilidade de água do mundo, a água é trocada por petróleo! E por que você acha que muitos países do mundo ficam de olho na bacia Amazônica? Eu sei que alguém pode estar pensando: E as técnicas de dessalinização da água do mar não resolveria o problema? Não! Ela gera uma água residual altamente salina que prejudica o ambiente, é extremamente cara e consome muita energia.
Mas qual o Prefeito de nossa região que teria coragem de criar projetos assim, arrojados, futuristas?
A água, na literatura, tem memória. Assim como o Rio Almada, o rio de todas as almas e de todos os povos que nos abastece.
Infelizmente, este é só um texto. Quiçá, um alerta. Mas vai também ser esquecido. Afinal, Emilly Elisabeth Dickinson estava certa: “A água se ensina pela sede”. No entanto, se você se aperfeiçoar na arte de escutar saberá que, como disse Altino Caixeta de Castro: “Só quem ouviu o rio pode ouvir o mar”.