Nas últimas semanas tivemos conhecimento do programa de trainee exclusivo para negros, cunhada pela empresa Magazine Luiza, aqui no Brasil. A ideia busca reparar os danos de pelo menos 300 anos de escravidão que, aliás, marcaram as estruturas sociais do país, dado que estes foram excluídos do processo de civilização da nação. Pensar a questão dos negros em países como o Brasil, é pensar em dimensões éticas que reclamam por reparações que afetaram não só o passado, mas também o presente.
Vede, por exemplo, matéria trazida pelo portão G1, com dados fornecidos pelo Ministério do Trabalho em 2018: “Brancos são maioria em empregos de elite e negros ocupam vagas sem qualificação”
É por esse motivo que programas como o da Magazine Luiza sugerem uma marcha em direção à promoção da justiça, igualdade e fraternidade entre os brasileiros.
No entanto, o programa sofreu inúmeras críticas, inclusive, por um membro da DPU, o defensor Jovino Bento Júnior. O defensor acusa ser esse um "marketing de lacração" que não calcula o ônus da desproporção causada nos outros trabalhadores, neste caso, os brancos. Embora não diga, o defensor parece ventilar uma ideia que não encontra respaldo na literatura acadêmica, ou seja, a de “racismo reverso”. Aliás, esse é o racismo à brasileiro, isto é, aquele que para além de dar continuidade ao racismo, é aquele que não permite qualquer tipo de reparação às vítimas. Mal comparando, é como se uma vítima de roubo não pudesse ser reparada com os seus pertences, caso as autoridades conseguissem resgatá-los.
O grande intelectual brasileiro Milton Santos diz algo que explica bem as retaliações sofridas em casos semelhantes ao da Magazine, diz ele: "Por isso, talvez ironicamente, a ascensão, por menor que seja, dos negros na escala social sempre deu lugar a expressões veladas ou ostensivas de ressentimentos (paradoxalmente contra as vítimas)".
Os brancos, ironicamente, se acham ressentidos e até vítimas na medida em que não foram eles que provocaram tal cultura, mas os brancos de 300 anos atrás. Entretanto, não se trata de penalizar os brancos da contemporaneidade (estes, serão punidos, somente, se promoverem atos racistas), mas de reparar os direitos dos negros que foram sabotados por processos escravocratas. A verdade é que para vencer 300 anos de escravidão não é suficiente dizer que negros, de agora em diante, não ficarão presos em correntes, ou terão péssimas refeições, ou seja, um jogo zerado onde negros e brancos convivem, mais do que isso, é preciso de programas como o da Magazine que promova igualdade na medida em que coloca negros e brancos nos mesmos espaços, nos mesmos empregos, nos mesmos salários e nas mesmas oportunidades.